Um dos primeiros times de mulheres do Brasil teve a Marta de sua geração, um técnico aguerrido, e esbarrou no preconceito para encerrar as atividades com apenas duas derrotas em mais de 30 partidas.
Muito antes da ascensão que vive atualmente o futebol feminino brasileiro, um grupo de mulheres desbravava a modalidade ainda nos anos 1980 e, mesmo sem incentivo de grandes financiadores, se tornava um fenômeno local em uma cidade do Sul do país. Tanto pelo nome sugestivo, como pela qualidade das atletas.
O Esporte Clube Pé de Vento Futebol Feminino foi um time de adolescentes formado no início dos anos 1980 em Ubiratã, município no Oeste do estado do Paraná. Amigas apaixonadas por futebol que antes apenas brincavam em campinhos de terra. Mas um dia decidiram se juntar e formar um time.
O tempo passou e elas foram ganhando fama. Ainda assim, tinham que continuar lutando contra o preconceito e as dificuldades. Hoje, todas elas lembram com carinho quando promovem reencontros, cheios de emoção – e muito bom humor.
Além de técnico, o “Tonhão” fez as vezes de arquivista. Ele quem guardou o máximo possível de registros da história do Pé de Vento. Com ele, se sabe que o time jogou junto 34 vezes. E perdeu apenas dois jogos. E também cuidou dos uniformes das jogadoras. Tão bem que as camisas “encolheram”, segundo elas.
E o treinador Tonhão mostrou ser bom em coletivas: ele exaltou a qualidade de todo o grupo, em detrimento de uma ou outra atleta.
Se Tonhão não quis apontar quem era a melhor jogadora do Pé de Vento, as próprias atletas não hesitaram: Eliana Ribeiro.
Ela, que chegou ao time “por acaso”, foi uma das jovens que ficou mais feliz quando foi convidada para integrar o time mais bem sucedido de Ubiratã.
Eliana foi comemorada na chegada ao encontro das ex-atletas do Pé de Vento. Artilheira do time e com gols em praticamente todos os jogos, ela continua vivendo em Ubiratã. Até deu entrevista para um jornal como a “ídolo” do Pé de Vento.
A mulher-gol se emocionou muito ao ver as amigas, que antes da sua chegada, falaram que estava para chegar a “Marta” daquele time.
O Pé de Vento foi ficando conhecido. E imbatível: o time chegou a disputar mais de 30 partidas. E perdeu apenas duas vezes.
No entanto, o time começou a esbarrar nas dificuldades. Depois de um certo tempo, o nível delas ficou tão alto que foi cada vez mais difícil encontrar adversárias. Até anúncio no jornal o técnico Tonhão colocava, procurando.
Mas o problema principal foi a falta de incentivo. Que assola o futebol feminino como um todo – pela falta de mulheres a quem enfrentar – e para as próprias jogadoras do Pé de Vento, que queriam alçar voos mais altos, mas esbarraram na impossibilidade de evoluir por puro preconceito da época, que impedia o apoio ao futebol feminino.
Uma das atletas, Fátima Olivares, integrava o Pé de Vento escondida dos pais. Eles a proibiam de jogar futebol - uma história que se repetiu muitas vezes, no Brasil e no mundo.
Com tantas dificuldades, elas decidiram encerrar as atividades. Quase 40 anos atrás, o Pé de Vento entrou em campo pela última vez. Em 27 de maio de 1984, o time se despediu do estádio municipal de Ubiratã com mais uma vitória: 2 a 0 sobre o Ouro Verde, com gols de Margareth e Leonir. Foi o último ato de um time que fez história na cidade. E foi um foco de resistência de algumas das primeiras brasileiras a jogar futebol contra tudo e contra todos.